12.4.06

Complexo de Ofélia

Num tempo distante, em Paris, Satine, a dançarina de cancan que queria ser grande atriz, a tísica, acaba e destroçada por conta do Duque, em pleno Moulin Rouge - com medo, muito medo mesmo, de Virginia Woolf - prometia um dia voar, voar para bem longe, deixando tudo para trás... em busca do grande amor... Chris? Não! Joe! Sendo que, Joe Gillis, estava morto, na piscina, por ter se aproveitado de Norma. Mas, mesmo em sua vida medíocre, ele não sabia disso e, em seu orgulho, continuou sem saber de nada ... de nada, pois ele nunca sabe de nada... e, Norma, acompanhada de Lyly Encarnada, a louca dos pontinhos (ou seria um código indecifrável?), cantavam "Surrender" -- pra o macaquinho morto, mas, ao mesmo tempo, empurrando Joe bem pro fundo da piscina – Acabada a canção, Norma pedia praquela que é da Lira (e não pode negar) pra lhe falar do sonho – aquele, da tatuagem, do cinto e do rosto desconhecido... e ela, espantada, permanecia em silêncio. Um silêncio que poderia ser cortado com uma faca! Satine, por sua vez, como numa mutação à vista, finalmente, voou para bem longe do Moulin Rouge e viu a lua no céu e no mar - onde encontrou Apeles Espanca que, nào menos afogado, lembrava das palavras de Bela, a louca alucinada, sobre Joe (ele, sempre ele): -- Não, não vale a pena continuar dando pedras preciosas - pois só se iguala ao prazer de as dar, o prazer de as receber! ...e Apeles, também mortinho, no fundo da piscina, sorriu - seu sorriso de criança-pálida... dando as mãos a Joe, que, triste, permaneceu na piscina enquanto todos diziam Amém. Numa conversa de pé de ouvido, outro dia, Maggie, the cat, me lembrou, de sua vez, que ainda estava no teto de Zinco Quente, sem querer pular, pois, gatos, sempre, ficam e resistem até seus últimos limites. Menos Grizzabella, the glamour Cat, que ainda espera o dia que está raiando pra, finalmente, ir pra o outro lado, saltando da ponte para dentro da vida. Do outro lado da margem, completamente fora de seus limites, todavia, Blanche Du Bois.... dizia... rindo, na cara de Mitch, o imbecil que a abandona na porta do Tarantula ou será do Hotel Globo? -- "Eu não quero realismo. Eu vou te dizer o que eu quero. Magia! Sim, Sim, Magia! Eu tento dar isto às pessoas, eu invento coisas para elas. Eu não conta a verdade. Eu conto o que deveria ser verdade..." Blanche, de mala em punho e, ainda, dependendo da bondade de estranho, ajudou Satine a sair do mar. As duas, deram-se as mãos, e como uma só – rumaram ao desconhecido – perdidas, em sonhos que não acabam nunca. Nem com um, nem com outro. Nem com nada. Por mais que ninguém mais acredite em nada. -- E conta-se, também, que, até hoje, muitas, muitas lanternas, vermelhas de sangue, som e fúria, cobrem as luzes da cidade!... Como um âmbar, elétrico!